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O apagamento do 7 de Setembro: quando o desfile cívico vira festa sem pátria

O que fizeram com o desfile cívico do 7 de Setembro?

Por Paulo Silva – Zoom TV I Foto: Luana Almeida

Setembro sempre carregou um peso simbólico na história do Brasil. É o mês em que celebramos a Independência, o marco de uma nação que rompeu as amarras coloniais para construir sua própria identidade. Mas o que vi neste ano de 2025, em uma cidade da região metropolitana de Salvador, me deixou com uma pergunta inquietante: o que fizeram com o desfile cívico do 7 de setembro?

No meu tempo de escola, o cenário era outro. A semana da pátria transformava as salas de aula em verdadeiros templos de patriotismo. Professores e alunos preparavam trabalhos, faziam ensaios e, no dia do desfile, íamos às ruas da cidade toda enfeitada de verde e amarelo para celebrar os heróis que deram a vida pela independência do Brasil. Era uma homenagem carregada de respeito, que exaltava nomes como Dom Pedro I, Dona Leopoldina, José Bonifácio, Almirante Tamandaré, e tantos homens, mulheres e soldados anônimos que tombaram para que o país pudesse ser livre.

Posteriormente, nas Forças Armadas, quando tive a honra de integrar e vestir a farda da Marinha do Brasil, aprendi a valorizar ainda mais esses homens e mulheres. Compreendi que o 7 de setembro não é apenas uma data no calendário, mas um convite à reflexão, ao respeito e à consciência nacional.

A desconstrução de um ato cívico

Neste ano, por cair em um domingo, muitas cidades baianas anteciparam a celebração para a sexta-feira, dia 5. Fui até uma dessas solenidades acreditando que encontraria a mesma reverência que aprendi a cultivar desde criança. Mas o que presenciei foi uma mistura de perplexidade e tristeza.

No palanque, autoridades municipais e um militar representavam o aparato oficial. Mas onde estava o destaque para o pavilhão nacional? O Hino Nacional foi executado sem que a bandeira estivesse no centro do dispositivo. O Hino da Independência, tão simbólico para a data, foi simplesmente ignorado.

No lugar de solenidade, ouvi músicas de Daniela Mercury e outros artistas populares. Nada contra a cultura brasileira – pelo contrário –, mas precisamos entender que uma cerimônia cívica não é um carnaval fora de época. A independência foi conquistada à base de espada, sangue e perdas irreparáveis, e não com coreografias e espetáculos folclóricos.

O que vi foi uma colcha de retalhos: quadrilhas juninas, escolas de samba, bailados, homenagens a músicos e ex-vice-prefeitos, referências ao aniversário da cidade e até à origem do nome do município. Uma confusão de pautas que transformou uma das datas mais importantes da nossa história em uma festa sem identidade.

O apagamento dos heróis nacionais

Essa experiência me trouxe uma sensação incômoda: estamos diante de uma desconstrução deliberada do patriotismo. Não sei se por desconhecimento dos organizadores ou por uma escolha consciente, mas a verdade é que os heróis da independência estão sendo esquecidos.

A memória nacional parece se esvair entre a seletividade de homenagens e a negligência com o ensino da história. O resultado é uma geração que não reconhece seus símbolos, não sabe cantar o hino e não tem noção do sacrifício que permitiu que hoje vivamos em um país livre.

E isso não é apenas um detalhe. É um sintoma grave de um país que perde sua identidade. Quando a nova geração cresce sem referências de heroísmo, sem o orgulho de seus símbolos e sem reverência às suas raízes, o que sobra?

O risco de um vazio cívico

Não escrevo aqui como dono da verdade, mas como jornalista e cidadão que se recusa a aceitar esse vazio cívico. O 7 de setembro é mais do que um feriado. É o dia em que deveríamos nos lembrar que nossa liberdade foi conquistada com dor, suor e sangue.

Se transformarmos essa data em um evento folclórico genérico, estaremos cavando o túmulo da nossa memória histórica. Estaremos ensinando às crianças que tanto faz lembrar ou não de Dom Pedro, Dona Leopoldina ou José Bonifácio – quando, na verdade, foram eles que abriram caminho para que o Brasil fosse Brasil.

A pergunta que me atormenta é: de quem será a culpa? Da escola que não ensina? Dos gestores que não sabem organizar? Da sociedade que não cobra? Ou de todos nós, que aceitamos em silêncio o apagamento do que nos torna nação?

Conclusão: entre a festa e o luto

O que testemunhei não foi um desfile cívico, mas a caricatura de um evento cívico. E isso é lamentável. Não porque tenhamos que rejeitar nossa cultura popular – ela é essencial e deve ser celebrada em seus espaços próprios –, mas porque não podemos permitir que uma data que simboliza nossa independência seja diluída em um carnaval improvisado.

O Brasil precisa resgatar o sentido do 7 de setembro. Precisa ensinar às novas gerações que patriotismo não é bandeira de partido, mas respeito à história. Precisa relembrar que a liberdade que hoje desfrutamos custou vidas.

Enquanto isso não acontecer, continuarei a me perguntar: o que fizeram com o desfile cívico do 7 de setembro?

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